― E, então, Deus, é aqui que me conecto com o Senhor.
― E por que será? ― indagou-me o Todo Poderoso.
― Ah, porque és o Criador.
― Só por isso?
― Bem, é uma beleza extraordinária. ― articulei. ― Mas não vejo nada além disso ― emendei, um pouco incrédula.
― É uma pena. Pois quando criei o oceano, atribui toda a magia e poder de cura do universo.
― Cura? Ah, sim. Eu trabalho em um programa de televisão...
― Eu sei ― interrompeu-me, sorrindo.
― É, você sabe ― contribuí o sorriso e continuei: ― Fizemos uma pauta sobre osteoporose, falando dos benefícios do banho de mar no auxílio ao tratamento da doença.
― Sim. Esta é uma parte. Mas eu me refiro não somente a cura física, mas, principalmente, a cura espiritual.
― Entendo ― disse, pensativa, acreditando que pudesse omitir a minha pouca fé.
― Não, você não compreende ― contestou pacientemente o Senhor ― Acha que está aqui por acaso, não é mesmo?
No momento, não pude evitar o misto de espanto e júbilo por estar sendo descoberta, desvendada. Eu estava ali, desnuda de qualquer privacidade mental. Todos os meus sentimentos e pensamentos tão expostos quanto a areia.
Depois, num outro instante, aquela invasão chegou a incomodar um pouco, de uma forma que não sei explicar, apenas aquele aperto no peito que não sabemos de onde vem. Sem ponderar, respondi:
― Sinceramente, não sei o que pensar. Não sei se acredito na sorte, no destino ou se realmente sou a púnica responsável por tudo o que estou passando.
― Eu também já passei por isso!
E ambos gargalhamos com a declaração natural e despretensiosa.
― O Senhor tem senso de humor.
― É preciso.
― E o que mais é preciso para suportar a dor? Para vencer na vida?
― Acreditar mais em você mesma. Como eu acredito.
― Parece tão fácil. Mas a vida nos prega tantas peças que muitas vezes bate uma insegurança, um medo de fracassar.
― É aí que eu quero chegar. Deste modo, você boicota a sua felicidade. E volto lá atrás quando indaguei se realmente acredita que está aqui por acaso.
― Nada é por acaso. Isso é verdade?
― A mais pura verdade. Tudo tem um por que, uma razão de ser. Tudo tem um aprendizado. E embora tenha que semear no presente para colher bons frutos no futuro, é preciso acreditar mais na intervenção divina.
Ambos ficamos em silêncio por alguns minutos. Minha mente borbulhava de idéias ante as revelações. Eram milhões de questionamentos, mas não conseguia pronunciar uma palavra sequer. Estava ali, diante do Criador, sem saber o que falar.
Percebendo a minha inquietação, sussurrou:
― Você procura a paz?
Meus olhos encheram d’água. As lágrimas rolaram involuntariamente.
― É o que eu mais quero.
― Pois está dentro de você.
― E como faço para alcançá-la?
― Converse comigo sempre que precisar. Mas, além disso, cultive bons pensamentos, que irão gerar bons sentimentos. Por conseguinte, boas ações.
― Desculpe, Senhor, mas, mais uma vez, parece tão fácil na teoria.
― Sim, eu sei ― A voz continuava calma e paciente ― É um exercício diário ― completou.
― Seria como admirar o oceano e todo o mistério do mar, das ondas, tão cíclicas como os acontecimentos em nossas vidas?
― Agora você está começando a entender. Mas não há mistério algum. Está tudo aí, na sua frente, para ser degustado, apreciado. Prove a cura e encontre a paz interior.
E mais uma vez, silêncio. Senti que a Sua presença continuava ali, mas havia certa distância, como se Ele estivesse apenas me observando.
― Deus? – chamei, em vão.
Não havia nenhuma resposta, ao menos não em palavras. Pois, diante de tamanha força e invencibilidade, o mar trazia todas as respostas. Tudo o que eu procurava estava diante de mim e sempre esteve muito perto.
Percebi, então, que se tratava de uma coisa só. Deus, os homens e o mar não estão separados. São um só ser.

Livany Salles, jornalista e escritora nas horas vagas. Eu = sem justificativas, sem denominações ou qualquer rótulo estampado no vidro de um produto na prateleira